25 junho 2008

Bons momentos de JP Coutinho

Na Folha, sobre uma das poucas séries de TV a qual eu não conseguia assistir nem dez minutos:

Primeiro, ela defende que a melhor forma das mulheres se "libertarem" passa por serem tão vulgares como os mais vulgares dos homens: nas conversas e nos comportamentos. Uma mulher "liberada" é, digamos, um homem com sapatos Manolo Blahnik.

Mas a ironia maior é que não há "libertação" alguma em "O Sexo e a Cidade": assistindo intermitentemente ao filme (e relembrando as intermitências da série), só a Spice loira parece escapar aos sofrimentos típicos das fêmeas. Ela, pelo menos, é coerente, devorando macho atrás de macho sem sentimento de culpa. As restantes não se distinguem da minha bisavó, sofrendo com as inevitáveis tropelias dos homens. Elas são mulheres livres, com certeza e, no entanto, querem amarrar-se ao primeiro homem que encontram e idealizam. "O sexo e a cidade" não oferece a alegria libertadora das mulheres; oferece as lágrimas delas pelo Príncipe Encantado que, afinal, era um sapo. Não há coisa mais reacionária.

E não há coisa mais narcisista também. Porque se existe alguma originalidade em "O Sexo e a Cidade", ela não está no sexo. Está, curiosamente, no amor. Na definição de um novo e patético tipo de amor para o século 21. Não é por acaso que a narradora da história confessa recorrentemente que partiu para Nova York em busca de grifes e de amor. A intenção revela o mesmo propósito e a mesma confusão: encarar objetos, ou pessoas, como uma forma de preencher o vazio.

Admito que vestidos Vivienne Westwood possam cumprir essa função. Mas as pessoas não são objetos; e o amor é o oposto desse programa; ele não existe para nos satisfazer a nós; ele existe para lembrar que alguém é mais importante do que nós. Curiosamente, e nos últimos anos, só houve uma série televisiva com coragem para enfrentar essa verdade. Chama-se "The Mind of the Married Man". Não teve sucesso entre as massas.

E no Expresso, sobre a veia autoritária da UE:

Pessoalmente, nada disto me espanta. O que espanta é a alegre desvergonha da elite europeia que nem sequer oculta os seus procedimentos autoritários; procedimentos que repugnam qualquer democrata verdadeiramente liberal.

Mas não só. O espanto de hoje será coisa pouca perante o espanto de amanhã: ao ignorar e violentar as escolhas livres dos seus povos, a União Europeia está a semear o extremismo nacionalista que um dia despertará contra ela. E que despertará com uma violência política que transforma o referendo irlandês numa brincadeira de crianças.

E sobre a Internet:

Entendo o argumento de Keen. Mas é difícil concordar com o tom alarmista do autor. A Internet é um caos? Sem dúvida. Mas por cada vídeo idiota no YouTube, existem preciosidades musicais, históricas ou até filosóficas que seriam impensáveis há uma década. A melhor forma de enfrentar o "culto do amador" está em procurar, nas famílias ou nos amigos, nos livros ou nas escolas, o profissional em nós. Porque somos nós o verdadeiro "filtro" cibernético; os editores pessoais da informação que procuramos e recusamos; os programadores privados das imagens que nos inspiram ou repugnam.

A Internet mata a cultura tradicional? Pelo contrário: a Internet exige-a como nunca.