01 dezembro 2006

Se importar e parecer que se importa

Existe uma diferença muito grande e óbvia entre as expressões. Mas muita gente prefere apenas fazer parecer que se importa com este país. E assim angariar simpatias e, quem sabe, uma graninha a mais - já que ninguém é de ferro.

Importar-se verdadeiramente é trabalhoso e aborrecido. Sem contar que, invariavelmente, leva a conflitos que nem sempre são devidamente acalmados.

Como eu me importo - ainda - com o Brasil e com a cidade onde nasci e vivo desde sempre, não me conformo com a progressiva deterioração que ambos vêm sofrendo. Vamos ficar apenas no Rio de Janeiro para manter a lista reduzida, digamos.

Qualquer pessoa que já tenha colocado os pés fora do Brasil sabe que o Rio está em estado crítico. Suas praias imundas, suas ruas esburacadas e mal sinalizadas, o trânsito caótico e extremamente violento, segurança praticamente inexistente, transporte público catastrófico, etc. Isso nos lugares turísticos! Imaginem como não estão lugares como Cascadura, Madureira, Marechal Hermes, Realengo, etc. (bairros onde eu cresci).

Quem teve a oportunidade de visitar outros lugares no mundo tem a obrigação de denunciar o estado quase terminal no qual se encontra essa cidade. Não dá para ficar repetindo baboseiras do tipo "cidade mais bonita do mundo" a sério!

Empresas quando querem melhorar, atacando seus pontos fracos e enfatizando seus pontos fortes fazem um negócio chamado benchmarking, que nada mais é comparar-se com as concorrentes. Para isso ter resultado, entretanto é preciso primeiro querer descobrir realmente seus problemas e não jogá-los para debaixo do tapete.

Dizer por exemplo que as praias do Rio são belíssimas é jogar a sujeira para debaixo do tapete. As praias do Rio são OK, ou melhor: seriam OK se fossem praias limpas e com uma infraestrutura adequada. Mas não é o caso. Um morador de Ipanema não tem outra alternativa que não freqüentar aquele esgoto, mas um turista tem alternativas e está disposto a pagar por elas. Ele pode cair na conversa fiada uma vez, mas duas não.

Outra questão é segurança: não adianta dizer que o Rio tem os mesmos problemas de segurança que todas as demais cidades grandes porque isso não cola. Desafio qualquer um a me mostrar um caso de ataque a ônibus de turistas, em uma cidade de país desenvolvido, em plena área urbana - não era um gueto, era o Aterro do Flamengo! - como aconteceu com os turistas ingleses aqui recentemente.

Mais uma coisa: a qualidade do turista que nos visita. Até quando vamos continuar vendendo bunda e apenas bunda? Que isso faça parte de um conjunto de atrativos da cidade eu até entendo, mas este tipo de turista é o pior possível, aquele que toda cidade procura afastar. Turista bom é aquele que viaja com sua família e gasta, mas gasta muito. Exatamente como os brasileiros fazem em Orlando e New York, comprando, indo a museus, shows, restaurantes, parques e visitando outras atrações turísticas.

Num país onde tanta coisa é errada, é demais querer que um determinado setor seja exceção, mas eu acredito que a única saída para o Rio de Janeiro é mergulhar de cara no turismo como atividade econômica principal. Aruba, um país minúsculo do Caribe, há coisa de 20 ou 30 anos atrás, segundo relato de conhecidos que estiveram lá na época, era um lugar pobre, com pedintes nas ruas, muitos deles crianças. Hoje, após decidirem investir primordialmente no turismo, não se vê mais mendigos possui uma população que aprende nas escolas diversos idiomas, principalmente o inglês. Além disso, procuraram facilitar enormemente a vida dos seus principais clientes: os americanos. Resultado, imensos resorts lotados apesar das diárias nada baratas, o setor de serviços periféricos (restaurantes, esportes aquáticos, excursões, etc.) cresceu assustadoramente, sem contar as empresas de telefonia que lucram enormemente com as ligações roaming. Diversos vôos diários chegam e partem do aeroporto Queen Beatrix para os Estados Unidos e alguns países da Europa.

O resultado disso tudo é que uma ilhota com com aproximadamente 100 mil habitantes e um terreno majoritariamente árido (a água precisa ser dessalinisada e chega potável às torneiras) tem hoje renda per capta da ordem de 21.800 dólares anuais (a do Brasil é de 8300 dólares).

Para virar um big player neste mercado é preciso jogar bem e jogar pesado. O turismo é uma fonte de renda espetacular porque é limpa, não consome seus recursos naturais (pelo contrário, há o incentivo para mantê-los), requer trabalho leve que não desgasta a população, etc. Tem muita gente aí fora disputando essa torta e quem ficar de nhenhenhé não vai ficar com nada.