Sempre que vejo aquelas passeatas, cheias de deficientes na linha de frente, com cara de cão sem dono, a favor da pesquisa envolvendo células-tronco embrionárias eu fico com aquela sensação de que já vi isso antes.
Trata-se da moderna versão do Soylent Green. Somente coroas vão lembrar desse clássico da ficção - e eu espero que assim continue - científica.
[Spoiler: o parágrafo a seguir estraga a surpresa do filme]
Num futuro - 2022, agora não tão distante - a escassez de alimentos aflige o mundo. As pessoas são alimentadas por uma ração chamada "soylent green". Para encurtar a conversa, o protagonista do filme descobre que os tabletes de "soylent green" têm como matéria-prima os corpos das pessoas vítimas de "eutanásia". Mas não se escandalize, por favor: o procedimento é realizado em clínicas do governo para garantir uma morte digna, higiênica e - aham - agradável.
É engraçado tentar imaginar o contexto político deste filme, projetando o que vemos hoje em relação à pesquisa com células-tronco embrionárias (*): a Igreja recriminando a produção de alimento a partir de corpos humanos mortos pelo governo e vários grupos políticos fazendo pressão contra o obscurantismo religioso e promovendo passeatas cheias de famintos na linha de frente. Imagino os editoriais, repletos de "intelequituais" pomposos, discorrendo sobre como a ciência não pode ser obstruída e nos lembrando que o Estado é uma entidade laica.
A vida imita mesmo arte. (sempre quis usar essa frase!)
(*) É interessante reparar que a discussão malandramente se afastou do questionamento da existência ou não de vida humana num embrião. Usar como argumento a promessa de futuras possíveis curas de doenças, desprezando o que se está atropelando para consegui-las, me parece o mecanismo que o governo do filme utilizou para produzir o soylent green.