"Quando o oportunismo imediatista é percebido como a regra do jogo, cada um se defende como pode. Mas ao tentar agarrar aqui e ali a sua vantagem particular e o seu prazer imediato, ao transgredir e ignorar sempre que for conveniente as leis e normas impessoais de uma convivência civilizada, as partes terminam involuntariamente criando um monstro coletivo que não esperavam - um todo social hostil, no qual elas não se reconhecem e que se abate sobre as suas vidas com a fatalidade inocente de uma catátrofe natural.
O sentimento sincero e generalizado de cada uma das partes quando olha para si própria e ao redor de si é o de que ela não tem nada a ver com o mal que percebe à sua volta. O mal que ela encontra fora de si, contudo, não passa no fundo do resultado agregado de uma miríade de ações divergentes, cada uma delas minúscula em si mesma diante do todo social, mas conjuntamente e ao longo do tempo poderosas o suficiente para erodir o estoque de confiança interpessoal e configurar um quadro de incerteza, adversidade e violência que, se não chega a arruinar por completo, seguramente prejudica e empobrece de forma sensível o relacionamento humano na vida prática e efetiva."
Eduardo Giannetti, Auto-engano